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quarta-feira, outubro 26, 2011

dados





















lançaram-se extremos sobre o veludo azul, fácil demais para ser real. “seis, dois”, gritava o crupiê. suspiro do que não veio. no décimo quarto capítulo, perceberam que os dados são viciados derrota. um era seis e o outro nunca caía com um, ambos infiéis provocadores. se juntos somassem sete ou onze não estariam entregues aos jogos de sedução nem ao dilema da perda.

terça-feira, outubro 25, 2011

tramontina
























trago marcas de faca no peito, no ombro esquerdo e nas pernas. foi a falta de amor de meu pai por minha mãe que causara tais cicatrizes. herdei dele o abandono precoce e dela os amantes. e é aí que a minha história se parece com a de Carlos, a diferença é que não acredito em espíritos. no vigésimo sétimo capítulo, eles arrastavam um corpo para o rio, quase não havia sangue, não fosse o orifício no peito do primeiro tiro, o único que sangrava. os amores rasgam feito as facas de cozinha, pouco afiadas para não cortar os dedos, mas pontiagudas e no tamanho ideal para furar fundo.

segunda-feira, outubro 24, 2011

o circo

























se dissesse que não gostava do espetáculo ririam de mim. tenho antipatia por palhaços, pois se parecem comigo. minha desgraça é pano de fundo para a alegria alheia. a platéia esperava ansiosa pelo globo da morte, o barulho ensurdecedor para quem não quer ouvir mais nada. no décimo oitavo capítulo as labaredas giravam na mão daquele homem, segurava as adagas como se não cortassem. o público vibrava e a roda girava num ritmo frenético. ela era o alvo do atirador de facas.

domingo, outubro 23, 2011

a cruz
























a ignorância imperava ali. comprara um martelo e se encheu de alegria. nunca fora tomado por um sentimento tão crucificante e redentor. hoje todas aquelas redomas de vidro seriam quebradas. no décimo sexto capítulo, os olhos de Carlos estavam vazios e só pensava no dolo de quebrar a resistência dela.

sábado, outubro 22, 2011

baixio das bestas

















datilografou três possíveis desfechos para a cena, o personagem permanecia caído no chão. a malhação do bode expiatório cabia bem à ocasião, as pessoas se acalmam ao extravasarem suas insatisfações, mas por hora não descartaria os pregos e nem a arma de fogo. ela indagava-se diante da humanidade que crucifica seu salvador é melhor dar a outra face, abotoar nele o paletó de Judas ou deixar que ele resolva o problema sozinho?

quinta-feira, outubro 20, 2011

bailarina

















lembrava de meu pai naqueles dias de chuva, foi num dia como aquele que foi e não voltou. ele nunca esteve muito tempo dentro de casa e recordava-me dele apenas pelos presentes que trazia e pelo cheiro de bebida e cigarro que exalava. trouxe-me uma vez uma caixinha de música, dessas que vem com uma bailarina. talvez por isso bebia e fumava tanto, para ter de volta o cheiro de infância. no vigésimo quarto capítulo, Carlos a tirava pra dançar e ela sentia-se como a bailarina da caixinha, rodando, bêbada, sobre um mar de espelhos.

quarta-feira, outubro 19, 2011

o boi



















a quase guerra duma camisa no varal com o vento. uma cerca de arame farpado protege o quintal. o mito passeia pelo paladar, é carne! nada bucólico, cru, não causa náuseas e mata a fome. no vigésimo capítulo, sob a sombra da pedra preta, Guernica pasta. é bovina a carne que dobra no prato e meu olho desprende mil farpas na direção daquela camisa suada, entreaberta sobre o peito dele. consumo a erva da beira da estrada, a mesma que alimentou o boi. Carlos dorme, alheio à refeição e ao mito.

quarta-feira, outubro 12, 2011

preâmbulo

















o cansaço dominava o cenário, cochilou com o cigarro entre os dedos. o vazamento da pia dava o compasso da cena. a boca aberta, podia ouvir seu coração e a quietude sob a coberta alaranjada. a sensação de sossego beirava a fúria, jamais confessaria o que fez. talvez a beleza das coisas resida nesses momentos suspensos. o tudo habita onde aparentemente nada acontece.

domingo, outubro 02, 2011

olho mágico


















se olharam fixamente sem dizer uma só palavra. uniram-se para ver em alto relevo, o sangue na jaqueta de couro era só pretexto, o que queriam mesmo eram sensações em três dimensões. enquanto um sufocava, o outro respirava com dificuldade e o terceiro nem isso. mal se davam conta que precisariam se livrar do corpo, beberam até perder os sentidos e dormiram com o morto naquela noite.